Músicas do Bem

Como nossos pais (Elis Regina, 1976)

Mas é você que ama o passado e que não vê
É você que ama o passado e que não vê
Que o novo sempre vem…

É sempre assim… Basta a primeira nota, basta o primeiro acorde e o primeiro tom para que meu corpo todo se arrepie. Apesar de seu tom nostálgico e indignado, Como nossos Pais, canção de Belchior eternizada na voz de Elis Regina em 1976, será sempre para mim uma Música do Bem.

Talvez porque ela já na primeira estrofe comece falando a que veio. Talvez porque já em sua primeira estrofe eu perceba que seu compositor joga no mesmo time que eu. Talvez porque a emoção da Elis ao cantá-la seja simplesmente contagiante. Ou simplesmente porque é uma das mais belas canções brasileiras… E não sou eu quem diz isso… Como nossos pais aparece na posição 43 entre As 100 Maiores Músicas Brasileiras pela Rolling Stone Brasil.

Não quero lhe falar meu grande amor
De coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto é menor do que a vida
De qualquer pessoa

Escrita durante e sobre a Ditadura Militar no Brasil, ela descreve o cenário de repressão que era vivido pelos jovens daquela época.

Por isso cuidado meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal
Está fechado pra nós
Que somos jovens…

E ao mesmo tempo, lembra a todos que se conformar com esta situação não deveria ser uma opção.

Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina, na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz…

Sentia-se no ar, tinha-se esperança… Em breve, mudanças viriam!

Você me pergunta pela minha paixão
Digo que estou encantada como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento cheiro da nova estação
Eu sinto tudo na ferida viva do meu coração…

Como todo clássico, Como nossos pais espanta por ser tão, tão, tão atual! Ela foi escrita na década de 1970, mas poderia ter sido escrita ainda ontem, ou hoje, ou nesse mesmo momento.

Já faz tempo eu vi você na rua
Cabelo ao vento, gente jovem reunida
Na parede da memória esta lembrança
É o quadro que dói mais…

É dolorido demais pensar que os jovens que escreveram, ouviram e curtiram Como Nossos Pais na década de 70 estejam tão desiludidos. É dolorido demais pensar que eles, que acreditavam em um mundo de mudanças, sejam hoje os primeiros a acreditar que nosso país não tem mais jeito. E não é isso que a música diz? Esta música é mesmo sobre os jovens de ontem. E também sobre os jovens de amanhã.

Minha dor é perceber
Que apesar de termos feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais…

Existe mesmo alguma forma de não repetir os erros do passado? Existe alguma maneira de não vivermos Como nossos pais? Eu não sei… Talvez seja… Mas, por enquanto…

Nossos ídolos ainda são os mesmos
E as aparências não me enganam não
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer que eu tô por fora
Ou então que eu tô inventando…
Mas é você que ama o passado e que não vê
É você que ama o passado e que não vê
Que o novo sempre vem…

O novo sempre vem. E eu aprendi isso com meus pais… Que hoje já não acreditam tanto assim em mudanças…

Hoje eu sei que quem me deu a ideia
De uma nova consciência e juventude
Tá em casa, guardado por Deus
Contando vil metal…

Eu mesma já não sou tão jovem assim… E manter a chama acesa, manter a esperança acesa é muito difícil!

Minha dor é perceber que apesar de termos
Feito tudo, tudo, tudo, tudo o que fizemos
Nós ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais…

Mas que a esperança contida nesta canção não desapareça de nossos jovens, nem daqueles que um dia foram jovens. Que a esperança não desapareça de nenhum de nós. Aliás, ela precisa ser renovada todos os dias, a cada dia, como falamos em O amanhã pode ser inspiração para hoje.

Mas quem sou eu para falar algo? A Elis faz isso muito melhor… Assistam o vídeo e depois me digam se não estou certa. Essa é a versão que foi remasterizada pelo Nubank (que também adora uma novidade) e ficou perfeita!

O novo sempre vem! Por isso… #olhabempqbemtem

Rachel Jaccoud Amaro Mendonça

Rachel Jaccoud Amaro

Rachel é historiadora por formação, escritora por vocação e fotógrafa nas horas vagas. Ama quebrar paradigmas e, exatamente por isso, abraçou o Olha Bem pq Bem Tem como projeto de vida.

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